quarta-feira, 17 de abril de 2013

Prova Bimestral 1ª Etapa - 2012


Leia com atenção o texto que segue.

Não chore, papai

             Embora você proibisse, tínhamos combinado: depois da sesta iríamos ao rio e a bicicleta já estava no corredor que ia dar na rua. Era uma Birmingham que Tia Gioconda comprara em São Paulo e enlouquecia os piás da vizinhança, que a pediam para andar na praça e depois, agradecidos, me presenteavam com estampas do Sabonete Eucalol.
             Na hora da sesta nossa rua era como as ruas de uma cidade morta. Os raros automóveis pareciam sestear também, à sombra dos cinamomos, e nenhum vivente se expunha ao fogo das calçadas. Às vezes passava chiando uma carroça e então alguém, querendo, podia pensar: como é triste a vida de cavalo.
             Em casa a sesta era completa, o cachorro sesteava, o gato, sesteavam as galinhas nos cantos sombrios do galinheiro. Mariozinho e eu, você mandava, sesteávamos também, mas naquela tarde a obediência era fingida.
             Longe, longíssimo era o rio, para alcançá-lo era preciso atravessar a cidade, o subúrbio e um descampado de perigosa solidão. Mas o que e a quem temeríamos, se tínhamos a Birmingham? Era a melhor bicicleta do mundo, macia de pedalar coxilha acima e como dava gosto de ouvir, nos lançantes, o delicado sussurro da catraca!
             Tínhamos a Birmingham, mas era a primeira vez que, no rio, não tínhamos você, por isso redobrei os cuidados com o mano. Fiz com que sentasse na areia para juntar seixos e conchinhas e enquanto isso, eu, que era maior e tinha pernas compridas, entrava n’água até o peito e me segurava no pilar da ponte ferroviária.
              Ali mesmo me deixei ficar, a fruir cada minuto, cada segundo daquela mansa liberdade, vendo o rio como jamais o vira, tão amável e bonito como teriam sido, quem sabe, os rios do Paraíso. E era muito bom saber que ele ia dar num grande rio e este num maior ainda, e que as mesmas águas, dando no mar, iam banhar terras distantes, tão distantes que nem a Tia Gioconda conhecia.
              Eu viajava nessas águas e cada porto era uma estampa do cheiroso sabonete.

Senhores passageiros, este é o Taj Mahal, na Índia, e vejam a Catedral de Notre Dame na capital da França, a Esfinge do Egito, o Partenon da Grécia e esta, senhores passageiros, é a Grande Muralha da China – isso sem falar nas antigas maravilhas, entre elas a que eu mais admirava, os Jardins Suspensos que Nabucodonosor mandara fazer para sua amada, a filha de Ciáxares, que desafeita ao pó da Babilônia vivia nostálgica das verduras da Média.[1]
             E me prometia viajar de verdade, um dia, quando crescesse, e levar meu irmãozinho para que não se tornasse, ai que pena, mais um cavalo nas ruas da cidade morta, e então vi no alto do barranco você e seu Austin.
             Comecei a voltar e perdi o pé e nadei tão furiosamente que, adiante, já braceava no raso e não sabia. Levantei-me, exausto, você estava à minha frente, rubro e com as mãos crispadas.

Mariozinho foi com você no Austin, eu pedalando atrás e adivinhando o outro lado da aventura: aquele rio que parecia vir do Paraíso ia desembocar no Inferno.
              Você estacionou o carro e mandou o mano entrar. Pôs-se a amaldiçoar Tia Gioconda e, agarrando a bicicleta, ergueu-a sobre a cabeça e a jogou no chão. Minha Birmingham, gritei. Corri para levantá-la, mas você se interpôs, desapertou o cinto e apontou para a garagem, medonho lugar dos meus corretivos.
            Sentado no chão, entre cabeceiras de velhas camas e caixotes de ferragem caseira, esperei que você viesse. Esperei sem medo, nenhum castigo seria mais doloroso do que aquele que você já dera. Mas você não veio. Quem veio foi mamãe, com um copo de leite e um pires de bolachinha-maria. Pediu que comesse e fosse lhe pedir perdão. E passava a mão na minha cabeça, compassiva e triste.
              Entrei no quarto. Você estava sentado na cama, com o rosto entre as mãos. “Papai”, e você me olhou como se não me conhecesse ou eu não estivesse ali. “Perdão”, pedi. Você fez que sim com a cabeça e no mesmo instante dei meia-volta, fui recolher minha pobre bicicleta, dizendo a mim mesmo, jurando até, que você podia perdoar quantas vezes quisesse, mas que eu jamais o perdoaria.
              Mas não chore, papai.
          Quem, em menino, desafeito ao pó de sua cidade, sonhou com os Jardins da Babilônia e outras estampas do Sabonete Eucalol não acha em seu coração lugar para o rancor. Eu jurei em falso. Eu perdoei você.




Vocabulário:

Austin: marca inglesa de automóvel.

Birmingham: refere-se à bicicleta produzida na cidade de Birmingham, Inglaterra.

Cinamomo: arbusto ou árvore que pode atingir até 20 metros.

Coxilha: região extensa com muitas colinas, típica de parte do Rio Grande do Sul.

Desafeito: desacostumado, desabituado.

Lançante: ladeira, descida.

Piá: palavra muito usada em algumas regiões de Santa Catarina e Rio Grande do Sul para se referir a menino.

Seixo: pedra pequena e arredondada, muito comum em leitos e margens de rios.

Sesta: uma pequena cochilada no início da tarde, geralmente depois do almoço.


[1]  Os Jardins Suspensos da Babilônia foram construídos pelo rei Nabucodonosor, para agradar e consolar sua esposa preferida Amitis, que nascera na Média, um reino vizinho, e vivia com saudades dos campos e florestas de sua terra.

1ª PARTE: QUESTÕES SOBRE O TEXTO

01. O primeiro parágrafo do conto já revela ao leitor que a história está construída sobre um ato de desobediência.

     a)    COPIE do texto expressão revela isso?
   
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    b) De que desobediência se trata? Responda a essa questão marcando X na alternativa que melhor explica a desobediência narrada no texto.

(    ) Os meninos saem de bicicleta, às escondidas, para usar o presente que Tia Gioconda lhes dera.
(    ) Os meninos vão até o rio de bicicleta para causar inveja nos piás que moravam por perto.
(    ) Os meninos querem desafiar o pai e vão para o rio aproveitar o dia. Para isso, levam a bicicleta.
(    ) Os meninos vão até o rio de bicicleta no horário da sesta, o que havia sido proibido pelo pai.

      c) Encontre nesse parágrafo o trecho que expresse toda a ansiedade do protagonista em relação ao passeio até o rio e COPIE-O. (empregue aspas e reticências em sua resposta)
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      02. No conto que você leu, há um conflito que se desenvolve desde o início. Qual é esse conflito?
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03. Releia.

“Eu viajava nessas águas e cada porto era uma estampa do cheiroso sabonete.”

    a)    Marque X na opção que melhor define o sentido da palavra viajava, nesse contexto.

    (      ) deslizava, flutuava.
    (      ) imaginava, fantasiava.
    (      ) desejava, pensava.
    (      ) nadava, brincava.

    b) Sobre a relação existente entre a viagem do menino e as estampas do sabonete, podemos afirmar que as estampas do sabonete Eucalol

    (      ) falam de lugares muito distantes, só existentes nas imaginação do menino.
    (      ) fazem propaganda de lugares muito distantes, mas que não despertam o interesse do menino.
    (      ) falam de lugares muito distantes, maravilhosos, que mexem com a imaginação do menino.
    (      ) fazem propaganda de lugares muito distantes, já visitados pelo menino.


04. A partir de determinado momento, a tensão da narrativa cresce, numa sequência de eventos, até explodir num ato violento. Que fato determina esse momento de maior tensão (clímax)?
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05. Releia.
“Mas não chore, papai.
           Quem, em menino, desafeito ao pó de sua cidade, sonhou com os Jardins da Babilônia e outras estampas do Sabonete Eucalol não acha em seu coração lugar para o rancor. Eu jurei em falso. Eu perdoei você.”

Por que motivo o pai choraria?
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06. Embora a frase “Mas não chore, papai”, dita pelo narrador, já tivesse sido anunciada no título, ao aparecer no final do conto causa uma quebra de expectativa na leitura. Por quê?
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2ª PARTE: CONHECIMENTOS LINGUÍSTICOS

Leia o diálogo que segue para responder às questões 07 e 08.



07. Observe o diálogo entre Eddie Sortudo e Hagar no segundo quadrinho. Haveria diferença de sentido se Eddie dissesse “gordos homens” ao invés de “homens gordos”? Explique sua resposta.
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08. E no caso da fala de Hagar, no último quadrinho? Haveria diferença de sentido se ele usasse a expressão “homens grandes” em vez de “grandes homens”? Justifique.
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09. Observe o uso dos artigos destacados nas seguintes frases:
I.    Ganhou a  beleza nas duras lutas da vida.
II.   Até o falar dele emocionou a plateia.
III.  De repente, o novo surpreendeu a todos.
IV.  A pequena guardava nas mãozinhas um pequeno botão de rosa.

9  O processo de substantivação foi usado

(       ) em I, II e IV.
(       ) em I e III.
(       ) em II e III.
(       ) em II, III e IV.

10. Os trechos abaixo compõem um texto, mas estão desordenados. Numere-os para que componham um texto coeso e coerente e indique a opção que apresenta a sequência correta.

(   ) Essa invenção permitiu o sofisticado gosto dos reis franceses de colecionar livros, e a mesma revolução que os degolou foi responsável por abrir suas coleções ao povo.

(   ) Há cerca de 2.300 anos, os homens encontraram uma maneira peculiar de guardar o conhecimento escrito juntando-o num mesmo espaço. A biblioteca foi uma entre outras das brilhantes ideias dos gregos, que permanecem até hoje.

(   ) Apesar da resistência da Igreja, a informação começou a girar mais rápido com a invenção da imprensa de Gutemberg.

(   ) Assim, as bibliotecas passaram a ser "serviço de todos", como está escrito nos anais da maior biblioteca do mundo, a do Congresso, em Washington, que tem 85 milhões de documentos em 400 idiomas diferentes.

(    ) Depois deles, a Idade Média trancou nos mosteiros os escritos da antiguidade clássica e os monges copistas passavam o tempo produzindo obras de arte.

a) 1, 3, 5, 2, 4.            b) 3, 2, 4, 5, 1.           c) 2, 3, 5, 4, 1.       d) 4, 1, 3, 5, 2.       e) 5, 4, 1, 3, 2.







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